
Com um programa eclético, o evento apresentou, ao longo de seis horas, 21 atrações, que mobilizaram 63 artistas, oriundos de Argentina, Estados Unidos, Finlândia, Suécia e Itália e de quatro estados brasileiros. No teatro e em uma sala paralela ampla, ambas em estilo Art Déco, o público teve acesso gratuito a exposições de artes visuais, a apresentações de balé, de dança contemporânea e do ventre, poesia, canções latinas, estadunidenses e europeias e músicas clássicas e populares tocadas ao violão e ao piano. No último bloco de atrações da noite, uma aparição diáfana pôs a plateia em suspenso. A musicista Geusilene Débora Nunes, de Lambari-MG, solou três canções à harpa paraguaia. “A ausência de beleza, da harmonia, traz desconforto e mal-estar, afasta o ser humano de sua essência”, ponderou a pintora e organizadora do festival Renata Macedo.

O fórum e o festival de artes sul mineiro são realizações do Instituto de Ciência e Tecnologia Keppe e Pacheco, mantenedor das Faculdades Trilógicas (FATRI), “as únicas que unificam Ciência, Filosofia e Teologia”, de acordo com o site da entidade. As FATRI têm presença no Brasil em Minas Gerais, São Paulo, Goiás, Paraíba e Rio Grande do Sul, e no exterior em Alemanha, Colômbia, Estados Unidos, Suécia e Portugal. Em Cambuquira, no Grande Hotel Trilogia, onde aconteceu o festival, são oferecidos gratuitamente cursos de graduação presenciais em Artes Visuais e Gestão Ambiental, a distância em Teologia Terapêutica e Pedagogia Trilógica, além de cursos pagos de graduação, pós-graduação, idiomas e cursos livres.
As formações acadêmicas e livres oferecidas pelas FATRI se orientam pelo Método Trilógico. Criado nos anos de 1970 pelos psicanalistas brasileiros Norberto Keppe e Dra. Cláudia B. S. Pacheco, a trilogia analítica é desenvolvida em diversas partes do mundo, em cidades como Nova York, Lisboa, Londres, Estocolmo, Helsinki, Moscou, Paris, Lucca e Bogotá. O Método Trilógico, a partir de uma interpretação própria da psicanálise freudiana, da física, da filosofia e da teologia, propõe uma clínica analítica sistêmica, ancorada na sensibilidade e na fruição estética. “As artes e a beleza são a essência da civilização”, resumiu Gambucci.

As performances da noite foram divididas em três blocos. Nos intervalos, a plateia era estimulada a circular entre as exposições de artes visuais. No teatro, a superlotação fez com que o público excedente se distribuísse entre as obras em exposição nas laterais da sala. Quando os intervalos eram anunciados, acontecia um curioso balé. As pessoas, girando sobre os calcanhares, davam as costas para o palco e passavam a conversar a respeito das pinturas e ilustrações. “Olhem os quadros com calma, pensem no quê o artista quis dizer a vocês com a obra”, sugeriu Gambucci ao microfone, com discreta alegria. Talvez a alegria de saber que parte do público tinha acesso a exposições de artes visuais pela primeira vez. Na sala contígua ao teatro, onde foi concentrada a maior parte das pinturas e desenhos, se podia ver, entre outros achados, três telas do consagrado pintor argentino Eduardo Catinari, autor de estilo instigante, que assina a capa do filme “Di-Glauber” (1977), cultuado documentário de Glauber Rocha sobre o pintor modernista Di Cavalcanti.

No último ato da noite, Gambucci convidou Enézio a conduzir o público em uma grande aula de dança. Como se não fosse um improviso, os organizadores do festival, os artistas e a plateia recolheram depressa as cadeiras do teatro, abrindo uma pequena pista de dança em frente ao palco. Ali, quase todos dançaram forró e coreografias pop dos bailes dos anos 80, sob a batuta do mestre-bailarino. A exceção foi o estudante de Direito Luiz Augusto de Oliveira, que cruzava o salão aos rodopios, com os braços erguidos. “Eu prefiro as danças aleatórias”, justificou-se. Nem precisava.
O 10º Festival Internacional de Artes de Cambuquira foi a afirmação de uma filosofia de vida que tem as artes e a sensibilidade como fundamento e utopia: o fundamento de uma cultura superior em humanidade e tolerância, que dê azo à utopia de uma civilização.
Por Lelo de Brito
Publicado em Fundação Cultural Vagão 98 em 01/07/2022 em https://www.vagao98.org/post/em-cambuquira-mg-a-utopia-de-uma-civilização
e em Mariposas Espaciais – Jornalismo, Arte e Cultura em https://mariposasespaciais.com.br/2022/07/01/em-cambuquira-mg-a-utopia-de-uma-civilizacao/
Em Blog O Corvo-Veloz https://www.ocorvoveloz.com.br/2022/07/em-cambuquira-utopia-de-uma-civilizacao.html